31 de janeiro de 2010

uma gaivota predileta

para johnjohn (in memorian)

foi-se o voo amigo
o acolher de almas
nos desertos que atravessava
foi-se a asa do recomeço
o fino trato do silêncio
o dizer das coisas simples
foi-se o ombro a esplanada
o filho da madrugada
que espantou a solidão
foi-se no passo confuso
partindo todo o sentido
num gesto involuntário
foi-se a tatear a eternidade
sem parar e mais alto
enquanto o vento soletra
o nome imponderável da saudade

© Clivânia Teixeira

23 de janeiro de 2010

elos

quando de um momento após o outro
os dias despedem-se e acolhem a noite
adensam-se em meu íntimo
os tão sublimes instantes
em que me afogo nas lembranças
e embriago-me de êxtases sonhados
pronunciadas dos lábios teus aos meus ouvidos
quando vem da penumbra
a sombra de teu olhar
e de um vento arquejante
murmúrios teus a me chamar
enlaço-me a ti assim
por elos inexplicáveis
mas que me unem também a certeza
de que nesta vida eu vim para te amar

© Clivânia Teixeira

namorar

tocar nas mãos e sentir na pele
a seiva que dilata as veias
sentir no rosto o sopro
do arfar de uma respiração
que pulsa ou alivia o intumescer de poros
vislumbrar entre olhares tímidos
o indizível das palavras
traduzir os rubores nos rumores
das sensações que transcendem as cores
vislumbrar o desnudar lento e paciente
das partes que lentamente nuas
revelam-se vulneráveis e inocentes
aos apelos ardentes da paixão
murmurar entre línguas e dentes
o fluir das sensações adormecidas
deslizar entre lábios úmidos
o entrelaçar de gemidos e beijos
nas bocas que saboreiam
o soletrar das sílabas da paixão
mergulhar no éter
e sentir a lua enternecida
guarnecida de noite a caminhar entre estrelas
perceber-se como se ela própria fosse
na cumplicidade dos mistérios
que somem no amanhecer dos dias
perceber-se o próprio dia despertar
sob os raios flamejantes do sol
um celebrar inconsumível de êxtase
do comungar dos seres, do sol e lua
indestrutível sintonia que paira no cosmo
tal qual um eclipse perene de nós

© Clivânia Teixeira

sensualidade

misterioso reino
anjo e demônio mutante
incêndio que acalma
desejo em movimento
doçura e delírio mágico
que se consome
em sacrifício da paixão

© Clivânia Teixeira

terminal

amor sublime amor
que sucumbe em poesia
e guarda em versos
as cinzas de um coração

© Clivânia Teixeira

último pedido

preenche-me de teu vazio
silencia até findar
minha voz em sussurro
cerra todas as entradas
para que nenhuma porta aberta
me aguarde de soslaio
altera todas as rotas
até que meus pés
esqueçam de seguir teus passos
veste todos os disfarces
até que me canse de desvendar-te
seguirei plena de ti
meu vazio encontrará o teu
pois que inútil é o apelo
de findares em mim

© Clivânia Teixeira

um olhar de estrelas

migra o olhar no céu
onde o escuro é veludo
e a imagem do sonho
funde-se ao brilho das estrelas
é lá onde a lua toda magia
lembra-me teu sorriso
é quando a noite é algo assim
meiga e forma perfeita
de olhar estrelas
e pressentir delas a contemplação
como se teu fosse
o olhar a aquecer-me
sim, penduro-me a elas
por que sonhar é bom

© Clivânia Teixeira

beija a flor

tênue é o vôo
que vem do íntimo
olhares que migram
flor em flor
como a tornar possível
o alvo migrante
de etérea beleza
reino de melancolia
que invade o momento
e esvai-se lentamente
rio latejante, insinuante
a fluir entre as veias
pensamentos raros
delirantes, sutis
um respirar a insultar rumores
é como se perde o olhar
no contemplar de anjos,
de sonhos ou poesia
na rapidez do vôo
busca do que jamais se viu
ato contínuo a sugar o néctar
como se cada flor
fosse o sentir saudades
do algo que sequer viveu

© Clivânia Teixeira

a ostra e a pérola

tanto que poderia dizer
desta sensação que sinto
é como se de ti
sempre fizesse parte
és a concha perfeita
manto madrepérola
abrigo de invasão e aconchego
é mesmo assim que sinto
quando me chamas pérola
neste espaço transatlântico
onde belo amanhece
o mesmo gesto belo
que anoitece em ti
amar até que do ato em si
nada mais reste em solidão ou dor
pois para que serve o amor
se não for esta a razão de ser
amar nesta razão intrínseca
como se tu fosses a ostra
e eu pérola entranhada de ti

© Clivânia Teixeira

repente poético

não sou poeta a fingir poesia
ou apenas versos que sabem a dor
sou metáfora e verdade nua
ante os olhos que sabem ler
sou subterfúgio e entrelinhas
sem rimas para espantar a dor
seja lá dor de saudade
seja lá dor de repente
por que sei que já faço tarde
estes versos que escrevo triste
noite afora uno as estrelas
e confusão de lua a cometer poesia
pois quem sabe da dor que conheço
conhece da dor que não sei fingir

© Clivânia Teixeira

horizonte do olhar

o horizonte do olhar

eis o olhar
norte do caminho
que ousas seguir
seiva de entrelinhas
que desliza entre sorrisos
e palavras reticentes
tonalidade rubra
enfeite das interrogações
que pairam no ar
a exclamar suspiros


© Clivânia Teixeira

amores platônicos e nem tanto assim

tudo em nós se sobrepõe ao tempo
somos irremediáveis como o existir
é na intensidade do que sentimos
que permanecemos abstraídos dos porquês
somos unos e intrínsecamente ligados
nem a presença pode nos tornar mais próximos
o sentimento per(segue)-nos independente
e sendo assim resta-nos fundir as letras
no gesto mágico de transformar a saudade
compomos o poema do alento
um sentir melancólico que invade o silêncio
olhares taciturnos contemplam o mar de janela nenhuma
mãos crispadas delatam
toda a impotência de um suspiro
conjugamos assim a sintonia
dos seres que amam com a cumplicidade de saber
que naquele instante
as vontades aqui e alhures coincidem
e tudo supera o racional que prepondera
ou deveria

© Clivânia Teixeira

escrever saudades

como transformar
esta ausência
em algo mais
que um simples poesia
como escrever o poema
desta saudade
Que me escapa entre os dedos
silêncios e um pequeno
suspiro que foge do peito
em rima solta

© Clivânia Teixeira

seres amorfos

almas frias onde a tristeza
é por vezes a cadência que
marca os passos
indiferença tosca
que se julga sábia
embalada pelo silêncio notívago
seres frágeis
que se resguardam entre sons monossilábicas
e decisões unilaterais
ícones glaciais do egoísmo
estrelas natimortas que não amam
e quando assim é julgam-se doentes
seres que não incendeiam emoções
apenas morrem imperceptíveis e lentamente
como os sonhos que trituram no íntimo das entranhas

© Clivânia Teixeira

a paz da noite

fogem-me do papel as palavras
voam as intenções mudas
navego para o recanto
onde a paz é notívaga
pouso-me suspensa
no sonho de penumbra
entre seres inanimados
e olhares alados sorrio
deslizo suave entre os abraços
das mãos que me percebem inteira
e adormeço na intimidade dos gestos
que acalentam o corpo da alma
nas noites que deveriam
ser para dormir e não são

© Clivânia Teixeira

interregno

a tarde põe-se púrpura
anoitecendo o dia
na penumbra o eco da voz
acende no horizonte íntimo
a centelha que ilumina o sorriso
silêncios e segredos trançados
ss tristezas outonam
e ferve em primavera a alma
na calma da noite
uma flor veste-se de amarelo
para o sol amanhã

© Clivânia Teixeira

namorados

os lábios tremem
O coração aquece
o olhar desfalece
a boca sucumbe ao beijo
e a palavra é inteira
entre corpos
dizendo eu te amo

© Clivânia Teixeira

cárcere invisível

olhares atentos
aos gestos atônitos
dedos que estampam
a poesia do medo
um silêncio imposto
a interrogações nuas
entendimento obtuso
atitudes omissas
a vontade primordial
de ir e renascer livre
até de mim mesmo

© Clivânia Teixeira

medo

por vezes sinto medo
é quando os dias rolam
noites escuras em gestos líquidos
gotas de orvalho que acalentam a alma
em silêncio o momento acalma
os olhos encerram o olhar
e dormem para acordar os sonhos

© Clivânia Teixeira

tempo

é uma incansável medida
de usura e desgaste
até do que não existiu

© Clivânia Teixeira

a descoberta

não questione a trajetória
de seus passos errantes
os rastros no caminho
vincam a rota da volta
norte do seu futuro
lá estarei infinitamente
por que o sempre é algo assim
um compromisso sem amarras
com a eternidade

© Clivânia Teixeira

desdobramento

busco-te entre os sussurros da noite
que partem das horas
em que navego estrelas
no silêncio da madrugada
imponho-me nos passos etéreos
que não medem distâncias ou tempos
sonhos emergem oceânicos
guio-me por entre teus gestos
que me tocam com palavras
e me dizem do que as mãos
já não ousam falar

© Clivânia Teixeira

a flor do sonho

e vens suave no aroma
da flor que giro entre os dedos
mergulho neste abismo
que te funde em minha alma
flutuo na leveza do sonho
e desperto com a ternura do suspiro
deixando a magia
em rastros de pétalas

© Clivânia Teixeira

tu

para ti este tudo
que nutro em silêncio
a palavra maior
do sorriso em minha alma
o fogo da ausência
que me incendeia a vida
o prazer colhido
no espanto do momento
pois é no instante que te sonho
que toda a vida me é
é possível

© Clivânia Teixeira

sem ti

as emoções não afloram
os sentidos permanecem afônicos
os dedos mudos e despidos de gestos
palavras não ditas
ecoam no abismo da alma
no horizonte dos olhos
um vulto se forma efêmero
no sonho que plasma
a iminência do toque
o corpo desfaz-se no éter
sombras, sussurros, teu nome
suspenso em dígitos lacônicos
tua pele na carícia das mãos
e tua ausência rodeada
de abraços e saudades
nesta noite infindável
que te procuro

© Clivânia Teixeira

ele em tudo

e vem como um sonho
envolto de silêncio e mistério
destilando seiva essencial
nutre meu corpo e alma
e permanece do ébano ao azul
e espreita-me no brilho da lua
quando rasga o olhar da noite
voa no profundo do sono
ilumina a aurora de um sorriso
é quando os pássaros espalham alegria
por entre o espanto e o verde
o orvalho desliza carícias
é este o sonho que consumo
é assim que morre o tempo
ou a saudade já nem sei
mas sei que por ele em tudo
eu também vivo

© Clivânia Teixeira

por de sol

é quando cai no corpo
da tarde o cansaço
é quando no olhar da noite
paira a lágrima de saudade
as palavras amontoam
coágulos de silêncio
respostas que tardam
interrogações em aberto
e tudo é paz nesta solidão
mas é no sigilo dos corpos
que as dúvidas permanecem

© Clivânia Teixeira

etéreo

vaga é toda a existência
entre a terra e o azul
volitamos em mistérios e buscas
o que somos nos aprisiona
o que não somos
nos lança ao infinito
de uma vã filosofia

© Clivânia Teixeira

sinfonia do amahecer

imaginar-te de sonho em sonho
num desalinhar lento que descortina a vida
e sentir o pelo ascender ao desejo
o eriçar o sucumbir dos teus gestos em meu corpo
no deslizar suave das mãos
destilando em chamas
a ardência que afugenta a palidez da pele
tingir em rubor e intensidade uma paixão
inserir entre olhares e penumbra
um sorriso adocicado que antecipa
o êxtase do gozo premeditado
o cerrar dos olhos nossos vultos
tatuados em sombras na parede
um gemido a fugir dos lábios
e dar lugar ao beijo teu sabor
um momento inequívoco
de pertencer-te parte a parte
minhas entranhas a apalparem-te
e receber-te pulsante pleno de mim
o meu olhar ao te sentir louco e alucinado
invadindo a calma do sorriso
e um furor num deleite atentado
premeditado e impossível
pereniza o momento em eternidade
de em teu corpo infinitas vezes
sonhar e fazer-te poesia
dedilhando poro a poro os versos
que rimam com nosso desejo
mistérios que desfolhados no destilar do tempo
executam pele a pele esplêndida sinfonia
numa harmonia que celebra
em toques celestiais e delicados
o paradoxo do clímax consagrado
da sorte e presente de existirmos
mutuamente impossíveis e enlaçados em fantasia
onde um suave e lenitivo amanhecer
revela-se por entre o balançar da cortina
quando a manhã nos brinda em leve brisa
uma caricia meu corpo unido ao teu
é quando olhas o final das palavras
e percebes que já sou eu a fazer parte de ti
e é assim que perecemos os dias
unidos e em silêncio

© Clivânia Teixeira

O dom da renovação

mãos inquietas esculpem saudades
o pensamento é um rio a correr
lentamente como um sonho
mergulha o oceano de mistérios
num suspiro se alivia
o abismo do ser interior
e tudo se traduz na certeza
que é neste encontro
a essência de toda a paz
solitários ou não
toda ausência nos acompanha
célula a célula envelhecemos
tudo o que temos são quimeras
resta-nos um olhar mais ameno
às perguntas sem respostas
o não esquecer e o perdoar
quando o verbo é reciclar
e nesta confusão crescemos
sem mais escalar as razões
voamos ávidos de amanhecer
e antes que tudo escape
escrevemos mais um poema

© Clivânia Teixeira

um poema a mais

são os momentos
ditos na poesia do silêncio
dos sentidos que tocam
o corpo dos dias
e descortinam emoções
que se atropelam nos dedos
e na retina do pensamento
o sopro de um suspiro
desoprime o peito
que na liberdade
de se dar ao instante
perde a lucidez
porque o sentir é algo estranho
que só compreende a poesia

© Clivânia Teixeira

17 de janeiro de 2010

amar, a quintessência da alma

respirar a essência do sentir
e falar das sensações
do enlace que não sabe o toque das mãos
neste momento em que guardo das palavras
os segredos do indizível
de que jeito dizer no verso
sobre o aconchego do ninho
sem a força do abraço
ainda assim vens
com o requinte do imponderável
como um botão que desabrocha
dissonante da flor que o acompanha
é tanto o encanto que sorrio
Apequeno-me na glória de te pertencer
e assim ínfima recosto-me
neste peito que sabe
as coisas bonitas do imaginário
és perene e me permaneces
e destes absurdos que só os poetas dizem
digo-te és para sempre
nesta quintessência de infinitos
eu te perduro numa forma universal
onde o corpo é o intangível
afinal é na alma que te tenho
assim como o som da criação
riscas-me em traço célere
na unidade da emoção
o apelo que aquece as formas do íntimo
é este calor que me molda
é neste ser que arde em essência
que me transformas
fazes-me sentir viva e feliz
pois és todo o céu
que preciso haver em mim
é na paz do firmamento
é unindo as estrelas
que ainda soletro o teu nome

© Clivânia Teixeira

um grito na noite

invade-me e eu te advinho
dize-me dos momentos insones
envolve-te na redescoberta
rompe o silêncio da noite
volta atrás nos passos
que se perderam de mim
mistura-te entre gestos
palavras e emoções
e desnuda esta alma
deste corpo razão
que te amortalha em vida

© Clivânia Teixeira

a flor do sonho

e vens suave no aroma
da flor que giro entre os dedos
mergulho neste abismo
que te funde em minha alma
flutuo na leveza do sonho
e desperto com a ternura do suspiro
deixando a magia
em rastros de pétalas

© Clivânia Teixeira

ser poeta

fazer poesias
fingir dor ou alegria
como quem morde metáforas
e declinar verso a verso
o êxtase das palavras
fazer poesias
como quem dubla a vida
no seu momento mais fantasia
levitar dos sonhos em poemas
e embalar a vida em rimas
fazer poesias

© Clivânia Teixeira

enquanto isso ou aquilo

vôo de quando em vez
longe e perto
aqui e alhures até que as asas
esgotem o desejo de liberdade
olho para além
sinto tudo e todos
escrevo poesia que justifique os dias
ou a irremediável existência
é quando os pormenores me invadem a alma
confundem os sentidos para o torto
certo errado talvez quem sabe
ando pausadamente até que me cansem os pés
do pensamento tiro as asas do bolso
fujo por cima das mãos que escrevo
em gestos de ousadia
e espalho magia ou sorrisos
em redor do abraço

© Clivânia Teixeira
* participação Daniel Veiga

rodin

e ousas moldar minha existência
este corpo de emoções
no infinitivo da forma
tortura triangular
de entranhas barro e bronze
que imortalizas por tuas mãos
numa imagem que dói no olhar

© Clivânia Teixeira

versos notivagos

um rabisco explode
dos dedos
tremores e poesia
embotam os sentidos
no ébano da noite
uma ausência é sentida
um grito agoniza
a saudade inaudível
a solidão dos dígitos
é o eco da voz
do som arrependido
pronunciado no abismo de mim

© Clivânia Teixeira

marasmo

neste espaço hora
que não me cabe
anseio por emoções
que ausentem o vazio
deste sentir cinza
que embebe os sentidos
e que transformo em versos
para embalar o momento
de silêncio e solidão

© Clivânia Teixeira

a saudade

é ato sem cerimônia
que invade os sentidos
por algo que não pode ser

© Clivânia Teixeira

a noite

é uma mulher
que se desnuda
da luz do dia
o vestir-se de mistérios
um romper do caos interior
que se interpõe na penumbra
um olhar sinistro
para lugar nenhum dentro de si
um curvar-se notívago
que tropeça em fantasias
buscas e solidão

© Clivânia Teixeira

sinergia

os pares aglutinam-se
em soma ascendente
de resultado ímpar

© Clivânia Teixeira

busco-te

e vens de repente
como um cio
que se instala permanente

© Clivânia Teixeira

versos de sabá

na terra que me abriga os pés
jorra a poesia líquida
nas veias do existir
neste reino que não habitas
componho o ato
que antecede a unificação
escrevo os versos
que beiram o sonho
onde ânsia e desespero
não atormentam a espera
por que és da pergunta
a resposta do inesperado
és o por vir
que me pertence
és do olhar da alma
a visão divinal
és o mantra existencial
do meu eterno amanhã
és o essencial do sonho
que me sopra enquanto durmo
a memória dos segredos
que me unem a ti

© Clivânia Teixeira

de fantasias e de cinzas

antes que soasse o primeiro grito
de uma folia interior
quis eu fantasiar-me de noite
iluminada de estrelas a tua espera
quisera eu despir a noite de paixão
luxúria ou raio de luar
desfilar nos movimentos insinuantes
das sereias odaliscas
olhares negros amendoados
ondular em ventres tremidos
de pura hesitação sob confetes
serpentinas nos recantos jardineiras
de flores colombinas
a delirar de saudades
do pierrô apaixonado
e antes que o último grito agonizasse
e olhares perplexos, atônitos
contemplassem as fantasias pretendidas
adormeci envolta de noite e saudades
a quarta amanheceu cinza
e o sonho vestido de sol
despertou em mim

© Clivânia Teixeira

o ar que respiro

permaneço no alto
envolvida por emoções
que me tornam inalcançável
há um hiato ponte ou abismo
que separa meu olhar do teu
é que nada mais sei sobre a dúvida
que persiste no dissimulado
onde as palavras já nada dizem
sigo preenchida deste vazio
na paisagem onde imagino
o sonho de te encontrar
respiro a vida insatisfeita
com este ar rarefeito de ti

© Clivânia Teixeira

miragens do sentir

tuas mãos fartam-se
do vazio do meu corpo
quando desenham solitárias
imagens do imaginário
argila do sentir
possível da memória
num ato consentido
de modelar a espera
em doce suportação

© Clivânia Teixeira

folhas secas

andar sobre as folhas
que sucumbem outonais
no andar lento
compartilhar a solidão
dos passos ermos
comungar com os seres
emoções em cores esmaecidas
escutar da memória os segredos
que farfalham agrestes
e assombram o esquecimento

© Clivânia Teixeira

as entrelinhas do silêncio

as palavras não pronunciadas
pairam em letras soltas
a aglutinarem-se cuidadosas
em sílabas harmônicas
que predestinam aos ouvidos
ensaios sussurrados
de apelos mudos enclausurados
nos lábios do silêncio
as verdades despem-se
por mãos envoltas no cetim macio
de perguntas dissimuladas
desprovidas de vãs interrogações
pondera-se o clamor dos sentidos
e lentamente a paz se instala
o ar retorna a respiração
o bater ritmado ao peito
as certezas desabrocham
tal qual flores a acreditarem-se
alvoradas nas manhãs
tatua-se no semblante a serenidade

© Clivânia Teixeira

a voz e o silêncio

quando tua voz acaricia meu silêncio
sinto o frescor que ascende saudades
um temor que receia o adeus
perscruto nas palavras a lentidão
que retarda os gestos de aproximação
é quando mesmo não querendo
preenchemos a distância com abismos
na intimidade que nos une de vazios
mergulho no que sentimos
e penso sobre o absurdo
de aceitar esta ausência perene de ti


© Clivânia Teixeira

16 de janeiro de 2010

sobre silêncios

O que se cala no silêncio escapa-se aos ouvidos especiais que só almas atentas possuem
E o estar atento sobrepõe-se a morte das palavras...E mesmo que destino ou não , muda-se!

© Clivânia Teixeira

o lado escuro do silêncio

pensamentos arredios
transeuntes da mente
notas obscuras do ontem
atemorizam-me os momentos
amanhã de incertezas
quando em silêncio escuto
passos que caminham da memória
a despeito do ontem
do talvez amanhã
sigo os passos de outrora
o passado é a ilusão que desacredito
o medo que apavora
o pânico que atrai
o inesquecível é a verdade
é ilusão que trai
miragem que desvanece
amarelada por um tempo
chamado espera e dor

© Clivânia Teixeira

latitudes de silêncio

onde o mar é liso
e de profunda calmaria
unem-se em silêncio
duas margens
onde o vento não sopra
para longe o esquecimento
sublima-se em movimentos
barcos a deriva
de insólito encontro
onde o mar abriu-se
naufragou-se o encanto
não há por agora
uma ilha a aportar
para trás rastros de espuma
milhas e milhas de "nós"
onde no céu gaivotas cinzas
planam no ar em vôo cansado
espargem no éter
solidão e melancolia
onde um que de saudade
envolve-se de maresia
e fixam-se no mastro
as velas frágeis do desengano
acenam ao céu
sinais de uma aliança divina
plasma-se um arco íris

© Clivânia Teixeira

em silêncio

pousas nos meus lábios
os teus dedos nus de mim
um olhar úmido de ti
põe-se a chorar

© Clivânia Teixeira

silêncio, saudade e solidão

saudade é um sentir irracional que prevalece
é uma voz que não cala a presença
é o eco do som que perdura no abismo da ausência
é este estado amorfo da alma
que nos empareda entre o silêncio e a solidão

© Clivânia Teixeira

a razão de teu silêncio

é simples
queres que o significado das palavras
perca-se na poeira do tempo
assim nada há que retorquir
nada há mais a dizer
é assim que me pesa nos ombros
o desertar neste ocaso
miasmas de tuas reflexões silenciosas
solitárias e ao final egoístas
e me fazes prisioneira
nesta ficção de ontem
questionável de existência
e vôo em asas de interrogação
legítima ilusão no ar
banida ao infinito
de um passado que sempre tem razão

© Clivânia Teixeira

de nossos silêncios

há no íntimo de meus gestos
a vontade do indizível
há no olhar ausente a tristeza
descanso na sombra do silêncio
é como fonte esta saudade
que despimos na ponta dos dedos
murmúrio do som mais alto
um grito quase desespero
é quando sei destes anseios
que não dizemos do que sabemos
dos retornos que não escrevemos
sussurros aos ouvidos distantes
sem dizer dos desalentos
dos momentos que se calam
das lágrimas que não caem
na exortação deste clamor
deste tudo ou quase
que não é dito

© Clivânia Teixeira